eu moro numa cidade chamada Davis

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Lembro que quando passávamos férias em família em algum lugar diferente, na volta eu sempre estranhava pequenos detalhes da minha casa e da minha cidade. Duas semanas viajando já eram suficientes para dar essa sensação de estranheza e exigir um certo reajuste. Lembro de surtar com o desenho da cerâmica do chão da cozinha da minha casa. Lembro daquele sentimento gostoso de reconhecer coisas familiares e ir-se reajustando à velha rotina novamente.
Quando abri a cortina da janela da cozinha pela manhã e vi os caminhantes e corredores do Arboretum, com suas caras americanas, seus chapéus, meias brancas – caras mais famíliares para mim do que a das famílias arrumadinhas dos shoppings da Barra da Tijuca – tive a sensação de que estava reentrando no meu cotidiano.
A principio estranhei a brancura da minha cozinha, a claridade da casa, o verde entrando pela janela. Assustei com o matagal se alastrando pela horta, os tomateiros tomando conta de tudo, já lotados de tomatinhos ainda verdes. Estranhei o estranhamento do gato, a bagunça da casa, o cheiro de verdura podre na geladeira, o gosto da água, o cheiro do sabonete, o barulho do trem, o cotidiano que não parou enquanto eu estive fora.
Fomos almoçar num dos nossos “carne-de-vaca” de sempre. Escolhemos o chinês. Dirigimos pela cidade enquanto fazíamos a digestão e decidíamos o que fazer. Minha cidade, Davis. Ela está crescendo, mas como eu nem tinha reparado? Fomos à nossa livraria favorita enquanto esperávamos dar o horário para pegarmos uma sessão de cinema. Ganhei um livro, que ele insistiu em me comprar. Vimos o filme na sala lotada de pipocudos, de mãos dadas, rindo muito. Depois, fomos comprar uma pizza para o jantar. Fiz uma tour pela cidade que ainda estou vendo com outros olhos. A casualidade dos chinelos, a tranqüilidade, as centenas de SUVs, os preços em dólar, o calor seco, a rotina de uma cidade pequena cheia de charme.
Essa sensação de estranhar, reconhecer e reajustar é a melhor coisa do mundo! Pena que dure tão pouco e aconteça somente quando viajamos.

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