no final, um ponto

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Alguém outro dia me perguntou como se escreve um final para uma história. Colocando um ponto final, respondi. Somente isso.

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quarenta anos em quatrocentas páginas

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Queria poder escrever mais sobre a minha vida aqui pra poder ter informação consignada, como arquivo da minha história e dos detalhes que vou certamente esquecer. Pelo menos os últimos onze anos das nossas vidas estão razoavelmente registrados em correspondência por e-mail e fotos digitais guardadas numa caixinha preta e cinza chamada external drive. É bastante informação, embora desorganizada e sem uma ordem cronológica.
Julia Child já tinha 90 anos quando escreveu um livro de memórias, com a ajuda de seu sobrinho-neto. Nele ela detalhou com tanta minúcia coisas que tinha vivenciado aos 40 anos, que eu concluí que ela e o marido Paul tomavam nota de tudo, escreviam diários, cartas, tiravam muitas fotos e guardaram com cuidado todas essas relíquias por muitos anos. Com certeza todo esse registro facilitou na hora de colocar uma vida resumida num livro.
Apesar de não ser nenhuma Julia, nem estar planejando escrever nenhum livro, tenho pensado nesse lance do registro, especialmente agora, nessa etapa de vida quando tudo tem estado particularmente borbulhante. Meu desejo de registrar minha vida é consistente. Estou exatamente na idade em que as coisas começaram a acontecer para a Julia Child. Muita gente diz que ela começou tudo muito tarde, mas se começar tarde implica ter uma vida tão magnífica como a dela, estou pronta para a inauguração da minha!

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vou procurar a minha turma

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No passinho do elefantinho estou fazendo coisas que preciso fazer para a minha viagem. Ainda não comecei a chorar porque vou ficar dois dias sem dormir—ida e volta, mais toda a neuras de ficar numa cama estranha, num banheiro estranho, sem minhas coisas, minha rotina, meu marido, meus gatos. Mas daqui a pouco vou começar, é inevitável. .
Estava pescando na conversa de dois rapazes numa lingua estranha, que logo deduzi ser russo. Os gajos eram portugueses. Até meus ouvidos andam meio fora de órbita.
O céu fechou, com cara de chuva. Um vento gelado me fez encurtar caminhada que faço toda tarde. A primavera é engraçadinha e gosta de te dar umas rasteiras e te pregar umas peças.
Eu vivo ouvindo que preciso aprender a não me importar, a contar até trinta, a deixar pra lá, e estou finalmente começando a escutar.

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não me faça me odiar

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Quando coloquei os pés para fora do quarto já estava odiando tudo em mim, o cabelo preso, a echarpe com caracteres indianos, a blusa de gola rolê de listrinhas, a calça de boca larga, o sapato que não tinha nada a ver com a meia. Desci as escadas já pensando—está tudo errado, está horrível, vou me odiar! E me odiei. Estou me odiando. O que faz uma pessoa se vestir toda errada pela manhã e já sair se odiando, passar a manhã se odiando. Foi a pressa, claro. O fato de estar atrasada e não poder voltar e trocar de roupa 678843 vezes antes de sair toda esbaforida, e talvez evitar um malfadado dia odioso sem precisar passar a manhã desejando ir para casa e desfazer esse equivoco visual.

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o passado não condena