gentilezas

*

Eu tava me sentindo linda, moderna e diferente, com meu vestidinho de flores com renda comprado na boutique bohemian da moça incrível, e por cima coloquei um blaser masculino cinza. Eu tinha 21 anos, eu tinha um bebê de um ano, e estava na casa dos meus sogros quando um membro da família que não é minha olhou pra mim e disse rindo—acho que o defunto era maior, hein? Demorei um tempo pra entender, mas ele estava se referindo ao blaser grandão. Eu quis me enfiar num buraco, ir embora, aquilo caiu como um balde de água gelada na minha cabeça. E pra quê? Pra ser engraçado? Ou porque não tinha o que dizer? Com certeza nunca tinha visto alguém vestido de maneira diferente e falou essa besteira. Ouvi muita coisa desse tipo durante toda a minha vida no meu país de origem, trinta anos. Até eu me mudar pra Califórnia.

É até um pouco desconcertante o tanto que as pessoas aqui são generosas com as palavras. Não consigo nem contar quantas vezes nesses últimos vinte e um anos fui parada na rua para ouvir que minha roupa, sapato, colar, visual era legal. Gostei da sua blusa, que bolsa legal, seu visual é demais, você tem muito estilo! No meu trabalho é raro não ouvir alguma coisa, se não é uma coisa é outra, ou o conjunto completo—you’re gorgeous! Quanta diferença das frases grosseiras que ouvi quando era adolescente e nos meus vinte anos. Não mudou nada em mim, apenas fiquei mais velha, continuo usando o vestido de renda vintage com o blaser masculino, os casacos de fake fur, a gravata, as echarpes amarradas no pescoço, as bolinhas com listrinhas, as lantejoulas brilhantes, a tunica africana, as flores na lapela, as bijous vintages gigantes, só que agora não escuto mais piadas, escuto elogios.

Essa dinâmica é muito boa e além de sair da minha postura defensiva [ah, isso é velho, olha, tá furado, nem gosto muito] agradeço sorrindo e estou me treinando intensivamente para ser igual, retribuir, pay it forward e distribuir elogios. Hoje elogiei o turbante da menina que estava no front desk e o brinco de borboleta da minha amiga. Dar e receber positividade, acreditem, mes amis, é muito bom e faz muito bem.

  • Share on:
Previous
we ain’t seen nothing yet
Next
to keep calm

deixe um comentário

o passado não condena