the pandemic report

*

Aqui na nossa pequena bolha arborizada o que estamos vendo diariamente quando saímos pra caminhar pela vizinhança é um negócio até bonito. Nunca tinha visto famílias inteiras caminhando a tardezinha, filhos nos patinetes e bicicletas, bebês no carrinhos, a onipresente cachorrada feliz tomando uma fresca, correndo pra pegar o freebee nos gramados. A população saiu da toca, já que não há outro entretenimento fora de casa, a não ser essas caminhas pelas ruas. Nas caminhadas vamos acenando, cumprimentando gente que nem conhecemos e mudando de um lado para o outro da rua, para respeitar a distância ultra necessária, mesmo essas sendo bem largas e as calçadas generosas. Outros vizinhos apenas sentam nas suas varandas olhando o movimento, acenam um hello para quem passa, uns conversam, outros bebem vinho. De uma certa forma está tudo mais animado, muito mais agitado do que antes, quando se podia ir em bares, restaurantes, parques, museus. tem mais interação, apesar do distanciamento, que aqui mede 6 feet [1.83cm].

Faz três semanas que não enchemos o tanque do carro e o preço da gasolina está só baixando, baixando.

O Uriel leu que esvaziaram os abrigos de animais em New York. Foram todos adotados! Durante crises nós contamos com quem para nos dar conforto? Com eles, é claro!

Eu li que aqui na roça acabou o estoque de pintinhos, mercadoria [sic] muito comum na primavera, quando todos renovam os galinheiros. As pessoas querem garantir os ovos.

E nunca se cozinhou tanto. Sumiu farinha de trigo e fermento dos supermercados, estressados e não-estressados, todo mundo fazendo pães.

O Gabriel contou que a Serena está trabalhando sem parar na nursery, porque é primavera e normalmente a demanda por plantas, ornamentais e comestíveis, é enorme. Mas agora a demanda está imensa. Todo mundo querendo garantir a salada. Esses serão os Victory Gardens da guerra do século 21.

Nossa nova deadline para voltarmos à normalidade foi empurrada pra 1 de Maio, mas não contem com isso.

  • Share on:

duelo

*

A mulher com o cachorrinho fofo estava vindo na minha direção e eu já tinha me armado com um elogio para fazer pro bichinho, mas ela foi mais rápida no gatilho do que eu e antes que eu pudesse dizer um “a”, disparou:

—what a cute outfit you’re wearing!

Fui pega de surpresa e só me restou dizer —thank you!

  • Share on:

way too many nabos

*

Estou num país que está tentando remover um president corrupto e sem caráter.
E não estamos em 1992.

Se não houver impugnação, remoção e punição, os EUA perderão definitivamente a liderança no mundo livre e não serão mais um modelo de democracia.

Fiquei bem quase um ano sem ler a revista Bon Appetit no iPad. Nutro dia entrei lá e vi que removeram a interatividade da revista. Era a única que ainda valia a pena assinar por ser fácil de ler na versão digital. Agora virou apenas uma réplica da revista impressa.

Juntou essa desilusão com a minha repulsa progressiva por receitas com carne, então sem nem piscar disse goodbye old friend, see you in another lifetime, quando tudo será obrigatoriamente interativo e comer animais já esteja em completo ostracismo.

Noutro dia cheguei a conclusão que não existe mais salada só com verduras e legumes nos restaurantes. TODAS as saladas levam queijo ou algum tipo de carne [incluindo bacon e similares]. Ou pior, levam ambos, carne e queijo. Que belabosta isso!

Tem nabo demais dentro da minha geladeira.

“Siri, remind me to put the pickles in the fridge.”

She did.

  • Share on:

um tributo

*

Eu e o Uriel estávamos caminhando pela calçada, de mãos dadas como sempre fazemos, quando um carro parou no meio da rua, um homem baixou o vidro da janela e falou:

––que bom ver que ainda existe amor no mundo e que os casais ainda andam de mãos dadas!

<3

  • Share on:
*

  • Share on:

all things reconsidered

*

Cliquei num link e li essa história muito divertida—mais cheia de erros do que de acertos, mas de qualquer maneira divertida. Olho pra trás e não sinto saudades de nada, somente da falta de preocupação que eu tinha. Tudo parecia possível, mas era complicado, o futuro era um lugar distante e incerto, mas com inúmeras possibilidades, e o presente era aquilo que eu tinha e vivia sem nenhuma habilidade de analisar nada. Hoje já me sinto muito mais capacitada, mas um pouco mais limitada, caminhando numa trilha mais fechada, mais curta, onde os problemas são um pouco mais complexos do que jamais imaginei que seriam. Daqui quinze anos posso ler o que escrevi hoje e pensar o mesmo, de como a minha visão de mundo mudou. Deve ser assim mesmo olhar pra trás.

Tivemos o outono mais quente de todos que consigo me lembrar. Está tudo diferente, as árvores sucumbiram mais cedo, talvez pelos dias de ventania que foram muitos. Tenho a impressão de que de agora em diante tudo será muito instável e imprevisível, ou porque estamos envelhecendo e vendo tudo por outro prisma, ou pela dura realidade das mudanças climáticas, ou pela combinação dessas duas coisas. Nenhum verão ou outono será igual a algum outro pelo qual já passamos. Tudo será novo, visto com olhos de iniciantes.

  • Share on:

o passado não condena