long are we waiting awakening

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Nós caminhamos por zilhões de motivos diferentes e nos juntamos por um mesmo objetivo—todos nós queremos ser ouvidos. Uns estavam mais zen, outros mais preocupados, outros com raiva. Eu ainda estou na categoria dos enraivecidos, mas estou melhorando. Conversei com muitas pessoas nos últimos dias. Concordamos que saímos da passeata das mulheres nos sentindo bem melhor. A passeata que juntou milhões de pessoas ao redor do mundo, passeata pacífica, colorida, alegre, alto astral, criativa [os cartazes estavam maravilhosos]. Sem querer acabei vendo aqui e ali nas redes sociais, opiniões de arrepiar os cabelos. Uma fulana estava criticando as mulheres brancas que participaram da passeata na Austrália [onde ela vive] porque lá elas não precisam reivindicar nada, pois ninguém faz assédio sexual com elas, elas ganham salário equivalente ao dos homens [really?] e têm seguro saúde. Então esse supra-sumo da falta de altruísmo classificou a passeata australiana inútil, já que as mulheres de lá não precisam protestar nada [será?]. Não consigo entender uma cabeça encarcerada nesse grau de ignorância e egoísmo. Se não precisa protestar onde se tem benefícios, vamos todos acabar vivendo num mundinho triste, sem solidariedade ou empatia. Minha cabeça quase explodiu com isso. É muito deprimente. Depois vi machões brasileiros se auto intitulando liberais dizendo aqueles chavões altamente ignorantes—por que não foram então votar [fomos!], tem que aceitar o resultado da eleição [sério?], ele ainda não fez nada de errado [OMG!], essas feministas americanas precisam ser colocadas num manicômio [WTF!]. Que tal isso em pleno século 21? Meu marido deu risada quando comentei isso com ele e respondeu—essa gente está bem desinformada.

Falta informação, falta cultura, falta visão, falta pensar no outro, falta empatia, falta educação, falta saber a hora de admitir que as coisas estão mudando e aceitar que às vezes é melhor primeiro olhar e escutar, do que somente vomitar todo e qualquer tipo de opinião. Falatórios irresponsáveis assim é justamente o que não queremos mais.

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[ fuck this shit! *]

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The Women’s March — Sacramento
*poster favorito avistado durante a passeata!

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we started singin’ bye-bye, miss american pie

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Acordei às 6am com o som da tempestade, abri um pedacinho da persiana e olhei o vento e a chuva na escuridão. Pensei como seria bom call in sick e ficar na cama até mais tarde. Levantei, tomei meu café sem abrir muita coisa nas redes sociais e me preparei para ir trabalhar normalmente. Antes de sair liguei as duas tevês da casa, coloquei no canal TCM. As imagens do filme antigo passando me deixaram com vontade de ficar o dia em casa, debaixo das cobertas, alienada. O dia estava feio, escuro, tal qual o meu estado de espírito.

No trabalho o clima estava sombrio. Conversamos sobre nossos sentimentos, combinamos nossa ida à passeata de sábado. Meu chefe declarou o dia como não produtivo e nos incentivou a falar sobre o assunto na reunião matinal.

Então eu falei.

O presidente Barack Obama foi o meu primeiro presidente, como cidadã americana e do mundo. Eu nunca tinha elegido um presidente antes. No Brasil cresci durante uma ditadura militar e quando pude votar, não elegi meu candidato duas vezes. Deixei o país e só voltei a votar como cidadã americana. Obama foi meu primeiro presidente e o que realmente me fez sentir representada. Ele e a família me mostraram que o mais importante é sempre se manter a dignidade diante de toda e qualquer baixeza de caráter. Com o final desse mandato estamos dizendo adeus para a inteligência, a elegância e a eloquência. Dizemos adeus também para uma grandeza de caráter imensa, ao decoro e ao valor da palavra. Me sinto horrivelmente triste, mas sei que vai passar. E serei resistência. Começando amanhã, fazendo parte da passeata das mulheres em Sacramento. Até agora 673 cidades no mundo estão organizando passeatas irmãs da Women’s March em Washington D.C. Se isso não significa uma reação, não sei o que poderia ser.

No video Barack e Michelle estão visitando uma escolinha de crianças negras. Elas estão com as professoras no parquinho, encapotadas—cachecol, luvas, gorros. Dois gurizinhos sentados no balanço começam a gritar surpresos quando avistam o presidente—é o Barack Obama! é o Barack Obama! é o Barack Obama! E Barack reage com carinho, conversando e empurrando os gurizinhos nos balanços. Foram oito anos dessa família enchendo o meu coração de amor e meus olhos com lágrimas de emoção. Obrigada! Obrigada! Obrigada mesmo, por tudo!

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ways of seeing

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Para nós, pessoas do século 20, o mundo como conhecemos já não existe mais. Tudo o que crescemos considerando como o normal, já não é mais. Cinema, televisão, rádio, jornal, revista, fotografia, livros, telefone, cartas. Escrever com caneta, escrever na máquina, telefonar do fixo ou público, revelar fotos, folhear revistas, recortar imagens, fazer colagens, depender dos livros e da biblioteca para informação, ou dos jornais ou redes de tevês. Quando vi John Berger no documentário da BBC de 1972—Ways of Seeing, me pareceu que ele estava falando de um outro mundo, um outro século. E estava mesmo. A sensação é de que nada é mais o mesmo, que vivemos uma revolução sem precedentes, e que daqui pra frente quem ainda não se ajustou ao novo vai ficar para trás de uma maneira brutal. Vai ficar uma pessoa fora do seu tempo. Felizmente essa não serei eu. Nasci na metade do século 20, talvez viva até a metade do século 21 e ninguém, asseguro, vai poder me chamar de defasada, desconectada ou por fora.

Adoro tudo o que é antigo, amo os filmes do pre code de Hollywood, acho a moda do inicio até o meio do século 20 maravilhosa [embora entenda que devia ser tudo o máximo do desconforto], adoro ver imagens vintages, olhar pra trás, pra história, com curiosidade e interesse. Mas meu mundo é no século 21, com todas as modernidades e confortos que esse mundo pode me proporcionar.

A sensação mais forte, porém, é a de que apesar de todo esse desenvolvimento vamos fatalmente desbarrancar. Não sinto que o futuro será muito brilhante. Sinto que será sim bem diferente. Pro futuro que estou tentando visualizar agora, o século 20 vai parecer um sonho, um filme, com um roteiro bem ingênuo e muito mal escrito.

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[pisquei]

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Estava no trabalho olhando pra um bloco massivo de HTML enquanto escutava o podcast de um programa de rádio, onde no final a apresentadora diz  “happy holidays to all our listeners!”. E me fez pensar que o tempo passou acelerado, um dia eu estava no trabalho, olhando para blocos massivos de HTML, de repente estava no holiday break e numa piscada estava novamente no trabalho, olhando pra um bloco massivo de HTML, como sempre. Como se a minha vida acontecesse quase toda neste lugar onde trabalho, onde venho todo dia dirigindo meu carro pelas estradinhas,  onde sento na frente do meu computador e olho pros códigos,  vou e volto pra cozinha, bebo água ou chá, vou e volto pro banheiro, falo com a minha mãe pelo telefone, caminho sozinha ou com amigas, converso sobre comida durante o almoço, fofoco com meu chefe ou apenas converso sobre coisas da vida, olhando pra ele por cima dos monitores. Inverno, chuva, frio, primavera, flores, pólen, verão, calor, calor, outono, folhas douradas, plin plin, plin plin, plin plin.

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call letter blues

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Primeiro dia de volta ao trabalho, fiquei ouvindo rádio–notícias e música. Usando  agora o meu Bose Zen, porque minha meta para este ano é ficar ZEN. Todas as conversas ficam abafadas. Queria mesmo não ouvir nada, mas. Tudo bem.

E hoje foi o último “bom dia” do ano que dei pro grosso que ainda recebeu um “feliz ano novo” de extra e retribuiu com um grunido. Não estou mais pra essa gente. Ponto final.

Se eu dizer que é janeiro de 2017 e estou ouvindo Dylan, capaz de ninguém acreditar. Estou ouvindo Dylan desde a década de 70. Acho que até lembro a primeira vez que ouvi Dylan, era Lay Lady Lay.

Tenho cinco minutos e queria dizer que meu dia foi calmo, choveu muito, não caminhei e  até passei frio. Estou vestindo minha blusona listrada favorita e um lenço de flores que comprei numa thrift store [se morasse no BR iria ter que dizer “brechó”]. Estou de calça skinny e botas de cano alto, porque está chovendo. Esse é o uniforme dos dias chuvosos, todo mundo veste calça com bota. Detesto ser como todo mundo, mas hoje estou. Com exceção do lenço, que ninguém, ninguém, ninguém consegue me imitar.

 

 

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o passado não condena