flowers
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O mais engraçado é que eu me acho uma figura folgada. Mas na hora que tenho que fazer algo sério e pra valer, a minha personalidade obcecada aflora. Eu já escrevi sobre isso por aqui algumas vezes. Nada comigo é light. Se eu gosto de um artista ou escritor, eu tenho que ler, ver, ouvir, tudo o que a pessoa fez. Se eu faço uma atividade [como blogar, por exemplo] tem que ser nos micros detalhes do capricho. Porque eu já sou gringa há muitos anos, não me dou o direito de errar nadinha com a língua, não posso falar errado, nem escrever com defeitos. É exaustivo ser assim.
Passei a sexta-feira e o sábado escrevendo um paper que tenho que entregar na segunda-feira. Dessa vez escrever foi um parto. Nunca escrevi com tanta dificuldade. Talvez seja má influência da minha escrita informal em português. Ou talvez seja normal. Uma amiga me disse “escrever é difícil. em qualquer língua”. Eu que acho que porque é fácil escrever aqui, deveria ser fácil escrever de maneira geral.
Mas quem escreve vai concordar comigo que muitas vezes o texto saí como um mel escorrendo, noutras vezes as sentenças são como blocos de pedra. Depois que o texto está pronto é preciso refrescar os olhos. Eu nunca vejo os erros na hora. Tenho que fazer outra coisa, tomar um ar e daí voltar e corrigir. E sempre gosto que outra pessoa leia e dê palpites.
Ralar é até bom, dá uma satisfação ver o trabalho pronto e bem feito. Mas é importante não deixar isso virar uma rotina obsessiva!
Não é sempre que eu recebo uma dessas na minha caixa de correio. Até desacostumei de ler nas folhas de papel… Mas receber carta tradicional é uma delícia! Que bom que ainda existem escrevinhadores como ela.
Ontem recebi essa carta. Não só uma carta, mas uma carta recheada de coisas gostosas! Letrinha caprichada, adesivinhos no envelope, papel decorado, postais de presente e folhas e mais folhas de coisas boas de ler. Quando peguei a carta nas mãos, fiquei sem saber como abrir sem rasgar muito e estragar o capricho do envelope. Peguei minha correspondência no caminho pra universidade e fui lendo pela rua, caminhando, atravessando ruas, tudo sem nem tropeçar. Quantas vezes eu fiz isso no passado, lendo ávidamente cartas que eram aguardadas com ansiosidade. Foi bom relembrar os velhos tempos de correspondência tradicional. Obrigada, garota ! Agora vou ter que responder no mesmo estilo e desenferrujar a minha garranchuda letra de mão.
Está meio estranho… um silêncio, tudo vazio. Mas eu precisava disso. Fechei a torneirinha das listas de discussões, que enchiam alegremente minha caixa de e-mail diáriamente e me distraiam. Estou num momento em que não estou podendo me distrair. Estou fisicamente abalada com o tanto de coisa que tenho pra fazer. Mas isso acontece porque eu sou assim dramaticamente exagerada, não porque é o fim do mundo.
Saio com dor de cabeça das aulas, porque a minha professora é realmente hyper. Não comento isso como se fosse um defeito, muito pelo contrário. Admiro tudo o que ela faz e como ela faz. Outro dia ela contou que tem trinta e dois anos! Eu gosto de tudo nela: a criatividade, a articulação verbal, o humor, a bagagem intelectual e cultural, a flexibilidade, a informalidade, a simpatia, o carisma, e até a maneira casual como ela se veste e como ela decorou o seu escritório. Me sinto privilegiada por tê-la encontrado, no meio de tantas outras mentes brilhantes desta universidade.
Dá até uma dor de barriga folhear o catálogo da UCDavis e ver quanta coisa interessante pra estudar, quanta gente fascinante pra conhecer e socializar, quanta oportunidade de aprendizado. Mas como não dá pra fazer tudo, escolhe-se apenas um caminho. E eu já estou no meu. Por causa dele eu fico ansiosa, tenho dores de cabeça, falo sozinha pela rua, esqueço de comer, sonho com papéis e me sinto um bicho meio perdido, fora do meu ambiente. E ainda por cima não tô podendo nem me distrair. Mas está tudo muito bom…..
Já escrevi um outline do meu personal statement. Fiz isso em três chuveiradas. Eu me inspiro dentro da água. Foi sempre assim. Escrevi o outline na minha cabeça e verbalizei pro Ursão, que achou a idéia toda fantástica! Depois fiquei contando uns causos pra ele, fatos que recordei dentro do chuveiro e que talvez use pra ilustrar meu texto.
Muitos anos atrás, passando férias no Rio, eu estava com as minhas primas numa feira hippie em Ipanema. Naqueles tempos, onde eu ia carregava um livro comigo, era um hábito. E estava sempre lendo. Imagina se eu ia viajar sem um livro…. Só não sei explicar o que eu estava fazendo com um livro na bolsa, passeando na feira hippie! Era o calhamaço Cem Anos de Solidão, do Gabriel Garcia Marques. Eu não precisava estar carregando o livro num passeio onde não iria ter a oportunidade de sentar e ler. Fora que o livro pesava. Mas eu estava carregando o dito na minha bolsa de couro…. E por causa dele, me salvei de ser assaltada. Numa daquelas muvucas olhando barracas, um ‘dedos-leves’ enfiou a mão na bolsa tentando pegar a minha carteira. Por causa do tamanho do livro, o mané se atrapalhou todo e eu consegui sentir a mão dele dentro da bolsa. Me virei assustada e ele se pirulitou como um cisco….. Depois me deu a maior tremedeira, porque na minha carteira estava, além de todo o meu dinheiro, a minha passagem de ônibus de volta pra Campinas…. Garcia Marques e a minha mania de ler compulsivamente me salvaram!
Isso é uma história que ilustra um caráter. Infelizmente, eu não leio mais com a dedicação e fúria de antes.
Fui me encontrar com uma estudante de pós-graduação em Cultural Studies que está fazendo pesquisa numa área semelhante à que eu quero estudar. A professora recomendou que eu conversasse com ela. Mandei um e-mail, ela respondeu super-simpática e marcamos de tomar um café juntas ontem à tarde. Eu não bebo café. Só o café-com-leite morno da manhã. Então peguei um chocolate quente na cafeteria na UCDavis. Bom, já começou aí a pastelonice. Enchi demais o copo, tive que colocar outro copo por baixo, pro primeiro não desmoronar e ainda inventei de espetar um canudinho no líquido, que ficou boiando prá lá e prá cá, quase caindo. Não bastasse o copo cheio com o canudinho boiando e quase caindo, eu ainda carregava uma bolsa cheia de coisas numa mão e um guarda-chuvão longuíssimo na outra. Estava com um cachecolzão enrolado no pescoço e com o cabelão esvoaçante na cara. Não precisei de dois minutos pra derrubar o chocolate e fazer uma meleca incrível no chão da cafeteria. Foi um tanto de chocolate no chão, outro tanto na mão e a moça correndo pra buscar papel pra me ajudar a limpar, perguntando nervosa ‘are you okay?’, porque eu podia ter queimado a mão. Não queimei! Foi um milagre. Mas se queimasse, iria ser mais uma cicatriz pra coleção que eu já tenho na mão direita.
Melhor apresentação que essa eu não poderia fazer… Já fui mostrando quem eu realmente sou, sem disfarces, sem firulas. Oi, sou a desengonçada e atrapalhada Fezoca! Prazer!
Todo ano eu conto que fui à downtown, que fiquei encantada com as crianças, que comprei balas na última hora, que abri e fechei a porta pros trick-or-treaters por horas, que comi algumas balas, que estava frio, que me divirto no Halloween, que é uma das minhas festas favoritas daqui…..
2000
2001
2002
Este ano não foi muito diferente….!