é quase noite de halloween
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Finalmente o outono chegou! Hoje máxima de 14°C e mínima de 3°C. Primeiro dia do ano usando casaco… Agora vai!
Ontem fui ao dentista. Um problema num dentão lá do fundo. Problemas com dentões são familiares pra mim. Por causa disso, vou à uma dentista que é especialista em clientes nervosos e neuróticos. Nunca tive uma dentista assim como ela. Se tivesse tido, não seria assim tão sensível. Mas o dentista de ontem era outro – um especialista em canal. Uma delicadeza de pessoa. E fui tratada como uma rainha. Mas também, com o preço que ele cobra por um dente, tenho mesmo que receber todas as regalias. Voltei pra casa meio grogue e passei o resto dia na cama. O resultado é que fiquei o dia todo vendo tevê. E a noite também. Vi filmes até a 1am. Mexer com os meus dentes, afeta a minha alma. Não sei o que é isso. Mas a culpa do mal estar foi mesmo dos comprimidões que o dentista me deu. Os narcóticos e antibióticos vêm num saquinho lacrado. Abrir só em caso de necessidade. Dentista pra mim é que é o terror…. que Halloween, que nada….
Com esse friozinho, as crianças não vao poder sair à noite só com a fantasia. Vão ter que ter uma proteção extra. Mas aqui não é nada. Em Saska, nevava no Halloween e os pobres trick-or-treaters canadenses tinham que estragar o visual das fantasias, com casacos, luvas, toucas, cachecóis….!
Fui tirar uma foto para um documento. O rapaz com a polaróide tocou levemente o meu queixo, para me ajudar a ficar no ângulo exato para a foto. Colocou a ponta do dedo no meu queixo e se desculpou educadamente:
– “sorry to get into your personal space…”
Eu comentava com uma amiga outro dia, como a área de segurança entre as pessoas aqui é muito mais ampla do que no Brasil, onde o espaço físico individual parece ser muito mais limitado e essas invasões quase imperceptíveis acontecem o tempo todo e sem nenhum pedido de desculpa. Pra mim, que vivo pisando no pé nas pessoas, caindo sem querer em cima de estranhos e cutucando o vizinho de cadeira com o meu cotovelo, essa experiência de hoje serve de alerta. Luz vermelha, cuidado, no trespassing!!
Desperdicei o dia de ontem tentando me livrar de uma dor de cabeça canalha, mas tive uma noite rendosa, com muito papo interessante e duas surpresas. A primeira foi descobrir que uma das voluntárias trabalhando comigo na orchestra era minha vizinha! Papo vai, papo vem, de repente ela diz: “ah! você mora na Aggie Village! eu conheço o seu marido, pois eu trabalho na Engenharia e vivo cruzando com ele pelos corredores!”. Davis é um ovo!
A segunda surpresa aconteceu na salinha dos voluntários, onde todo mundo assina a lista de presença, arruma a gravata no espelho, pega as lanternas, toma café… Eu já estava saíndo, quando ouvi uma senhora e um rapaz conversando sobre o Brasil! Meu radar é bom! Foi um tóinnnn…. Já me liguei na conversa. Não é sempre que eu ouço americanos falarem sobre o meu país e o tom do papo era animadíssimo, um perguntando pro outro “quando você vai voltar lá?” e um contando vantagem pro outro sobre a proeficiência no português. Fui caminhando junto com eles pelo corredor, tentando ouvir mais da conversa [pra não dar nenhum fora] e já me preparando pra fazer uma pergunta e me intrometer [e dando um fora, mas who cares?]. Quando eu perguntei “vocês falam português?” e confessei que era brasileira, a senhora se animou toda pra conversar comigo. Mas o rapaz se inibiu. Acho que eu cortei o barato dele de exibir sua fluência em português para a senhora, que disse que não falava nada!
O rapaz trabalhou por dois anos como missionário em Salvador, Bahia. A senhora tem a filha, a neta e o genro [um francês] morando e trabalhando em Brasília. Ela contou que a menina de 4 anos fala inglês com a mãe, francês com o pai e português na escola e com o resto do mundo. E está tão fluente no português, que corrige a mãe e o pai. Criança tem esse poder, pois aprende língua com uma facílidade incrível e deve achar um horror o pai e a mãe falando com sotaque e dificuldade. E a senhora também me contou que a imigração brasileira está pegando no pé do casal, fazendo a vida deles complicada…. Eu disse ‘ah, que BOM! pelo menos agora eu sei que não é só a imigração americana que faz da nossa vida um inferno….!”. HoHoHo!
O escritor e diretor Michael Moore fez duas apresentações com lotação esgotada no Mondavi Center, ontem aqui em Davis. E deu um show, com direito a vídeo no telão, introdução feita por figuras de papelão de Sadam e Bin Laden, música de piano e cantoria. Depois da parte mais leve e divertida, entrou logo nos assuntos que todos estavam lá para ouvir: republicanos irritados, democratas chorões e Bush. Moore falou por duas horas e foi aplaudido o tempo todo. Ele fala muita coisa generalizada e pinta uma caricatura muito feia do povo americano. Mas a intenção é mesmo chocar, fazer pensar, mexer com o que está acomodado. Neste momento, o país precisa de alguém como ele, pra mostrar que o povo americano não é um bando de carneirinhos, abaixando a cabeça e concordando com o seu presidente maluco. E pelo visto, muita gente está com Michael Moore. Pelo menos os integrantes das duas sessões [quase quatro mil pessoas] da sua apresentação da segunda-feira no Mondavi Center.
No final da palestra, antes de abrir o microfone para perguntas e a fila para autografos no seu livro, Moore fez uma brincadeira para provar como a educação dos americanos está deixando à desejar. Chamou um canadense no palco [uma menina de Saskatoon, Saskatchewan – iurrru!] e três americanos estudantes nota A aqui na UCDavis. Ele explicou pra platéia que nas trinta e uma apresentações anteriores que ele fez pelo país, todas as vezes o canadense venceu os americanos. Ele concluiu – o canadense mais burro dá de dez nos americanos mais inteligentes. E foi perguntando coisas assim:
[pra canadense] qual o nome do presidente dos EUA?
[canadense] George W. Bush
[pros três americanos] qual o nome do primeiro ministro do Canadá?
[três americanos] ???????
[pra canadense] qual a capital dos EUA?
[canadense] Washington, D.C.
[pros americanos] qual a capital do Canadá?
[três americanos] Montreal? Quebec?????
Com outras perguntas de geografia mundial [países que fazem limite com o Iraque e Alfaganistão], Moore provou que tem alguma coisa errada com a visão que o americano tem do mundo. A brincadeira é boba e não mede inteligência, mas mostra o quanto a América está precisando expandir seu território em termos mentais.
Hoje eu vou ver qualé a desse cara. Vou trabalhar na apresentação do Michael Moore, no Mondavi Center. Como eu não vi os documentários dele, nem li nenhum dos seus livros, esse vai ser meu primeiro contato com o autor/diretor/polêmico. Veremos!
Na quinta-feira eu trabalhei no Mondavi Center. Era uma peça de teatro com dança chamada …the desire to return to the safety of Day. Eu gostei! Mas uma das voluntárias que trabalhou comigo estava doente, com tosse, sei lá o que mais. Ontem eu já senti que estava estranha. Peguei um vírus. Estou com aquela gripezinha que deixa a cabeça pesada, os olhos ardendo, o nariz escorrendo. Mas que droga!
Dormi de touca ontem…. Tinha um compromisso às 10am e quando acordei e olhei sonolenta pro relógio já eram 9:59! Pulei da cama, corri como uma louca desvairada e fui pra rua ainda com marcas de travesseiro na cara.
Fiz compras: bolsas, cintos de couro, blusinha, calça xadrez, saia preta pra trabalhar no Mondavi, sapato boneca….. tudo muito chic e na liquida, of course! E você acha que eu assisto ao The Look for Less pra quê???
Eu andei comprando umas Everyday Food – as mini-revistinhas de receita da senhora Martha Stewart . Muito boas! Já fiz um minestrone, que ficou ótimo. E ontem estreamos nossa mesa nova, com um jantar de beef strogonoff, que na receita da Martha vai sour cream, dill e serve com noodles. Tava muito bom. Nossos convidados adoraram!
Dois anos atrás fui ao oculista e ganhei um elogio. Aos quarenta anos minha visão era perfeita – 20/20. Agora ando tendo uns tremiliques, uns desfocos, dificuldade para ler letras pequenas. Só falta eu também ter que usar óculos – a maldição na minha família.
Saímos do nosso horário de verão. Agora estamos seis horas atrás do horário de Brasília.
“Todas as pessoas podem ser interessantes. Exceto as chatas, claro.”
Essas palavras são da garota, mas poderiam ser minhas.
Não há como dar mais uma oportunidade ou chance para uma pessoa que entrou na sua lista de chatos. Esses são geralmente irrecuperáveis. Na minha maneira de encarar as relações sociais, inicialmente todo mundo está no mesmo nível e eu sinceramente acredito que todo mundo carrega um portfolio de qualidades, e até defeitos, interessantes. Mas quando um chato se revela, todo o esquema muda. Um chato pode até ter o seu lado interessante, mas não consegue arranjar simpatizantes para apreciá-lo. Um chato dá choque, repugna, afasta, rejeita. Eu não agüento conviver com chatos. Eles me aborrecem, me irritam, me entediam com seus papos, que geralmente se resumem a uma combinação verborrágica sobre fama, poder, dinheiro e sabedoria. E o chato mais chato é aquele que se acha um sabe-tudo. E quer te ensinar. E precisa te ensinar. E o chato nunca saca que ele é um chato. O chato geralmente se acha super legal, o rei da cocada, arrasando o quarteirão, abalando Paris em chamas com sua personalidade carismática e bacana.
E pra piorar, o chato é inevitável. A única possível solução para desviar-se de um chato é fugir dele. Bem rápido, com gingadas estratégicas, descaradamente ou sutilmente, não importa. O essencial é dar no pé…..