A base de tudo
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Passei alguns meses do ano passado numa obsessão por sapatos, comprando ávidamente na Zappos. Já não estou mais tão dominada por essa idéia fixa, mas peguei a mania de olhar os sapatos das outras pessoas quando ando pelas ruas ou pelo campus. Dessas minhas observações ao acaso, constatei que a maioria das pessoas não está nem aí pro tipo de sapato que vai vestir. Se arrumam naquele visual bacana com acessórios e tal, e completam tudo com um chinelão. Aliás, o chinelo é praticamente o sapato oficial dos alunos da Universidade da Califórnia. Mesmo no inverno, lá estão os borrachões, encardidos e deformados. Vejo cada um que penso, peloamordedeus isso deve dar um chulé…
Gosto muito de ver a harmonia de um visual bem colocado, onde está tudo bem proporcionado—uma roupa legal, um acessório bacana e o sapato, sandália, bota, chinelo, tamanco de acordo. E pode muito bem ser um chinelo, por que não? Mas tem que estar harmonioso. É duro ver a bacanezidade de um visual se desagregar completamente assim que descemos nosssos olhares para a altura das canelas. Hoje vi uma menina que se sobressaiu, um estouro de chiqueteza e estilo, com um vestidinho de alça cor-de-terra, uma echarpe beige bem longa de pano no pescoço e um chinelinho preto de dedo. Nem precisa gastar os tubos, mas precisa saber o que comprar e como usar, pois sapato é realmente a base de tudo!
lost no more?
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Nós dirigimos pouquíssimo. Temos a sorte de morar praticamente ao lado do trabalho, então o Uriel vai trabalhar à pé e eu de bicicleta. Usamos o carro pra coisas pequenas—supermercado, consultas ao dentista, visitinhas, ou para alguns pequenos passeios de final de semana que fazemos pela região. Muitas vezes esses passeios são uma fonte de estresse, porque primeiro fica se discutindo onde vai, como vai, daí tem que imprimir mapinha do Google, depois sempre dá algo errado e a cena clássica final é sempre a do casal barata tonta perdido e brigando!
Mas a visita da minha irmã aqui mudou tudo. Ela e meu cunhado chegaram com um carro alugado que tinha um GPS portátil. Já tínhamos visto um fixo e outro portátil e sempre falávamos a frase clichê—precisamos urgentemente de um desses! Mas somos assim atrapalhados, enrolados e completamente sem tempo. Mas as duas semanas que passamos andando prá lá e pra cá no carro alugado pela minha irmã foi a gota d’água. Descobrimos a Raquel, que nos mandava virar aqui, dobrar ali, entrar acolá e vaptvupt, chegávamos ao destino programado sem o menor estresse! Maravilha das maravilhas!
Finalmente compramos o nosso GPS portátil. Com seisssentas patacas americanas se adquire um excelente. Nós ainda não exploramos direito o nosso, mas vimos que ele faz mil e uma coisas, além de nos guirar, toca até MP3. Fizemos um teste indo até Petaluma no domingo. Minha irmã e meu cunhado usavam os serviços da Raquel, que falava português brasileiro. Nós escolhemos a Jill, que fala inglês americano. As opções de linguagem são bem variadas. Tem de russo a tcheco, passando pelo francês de Quebec e o inglês australiano. E pode escolher a voz masculina ou a femininas.
A vida nunca mais será a mesma, tenho certeza! Faz uma diferença enorme ser guiado assim passo-a-passo, saber dos micro-detalhes, conseguir achar restaurantes, posto de gasolina, estacionamento, lojas, saber a temperatura, quanto tempo de viagem, ver os detalhes da paisagem, sem ter que enfiar a cara num mapa, folhear guia, imprimir direções. O único porém é a nossa própria insubordinação. Quando desafiávamos Raquel, virando aqui e não ali, como ela mandava, ouviamos ela dizer “recalculando, recalculando”. Fizemos a mesma coisa com a Jill, que proferiu o seu mecânico “recalculating, recalculating” muitas vezes. Eu digo, vamos confiar na Jill. Mas velhos hábitos são mesmo difíceis de mudar….
bem entendido
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Eu não participo de correntes, de amigo secreto, de blogagens coletivas, de forums e listas de discussão, de lances grupais, de panelinhas em geral. Também não surfo nas ondas, não sigo moda, não vou com as outras e não tenho turma. Por isso, mesmo a intenção sendo boa, não contem comigo.
vende-se uma camiseta novinha— $5,99
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Eu compro roupa de uma maneira obsessiva e desordenada. Eu não sigo um estilo único, compro o que eu gosto e o que eu acho que fica bem pro meu tipo físico. Meu guarda-roupa é bem eclético e não segue nenhuma moda. Tenho tido muitas fases—a das saias, a de vestidos curtos usados com calça, a das camisas brancas, a das camadas, a dos vestidos longos, a da cor preta. Tenho uma mania irritante de comprar peças iguais de cores diferentes ou várias peças diferentes da mesma cor. O preto, o cinza e o branco predominam. Nesse último inverno, foi uma avalanche de verde. Mas é tudo sem pensar, impulsivo e aleatório. Mas de modo geral acredito que eu tenho um certo estilo. O grau desse estilo eu avalio pelos comentários que escuto constantemente sobre as minhas roupas. É super comum pessoas passarem por mim e elogiarem minha calça, meu vestido, meu casaco, minha blusa, meu sapato. Eu fico feliz, digo “thank you” e sigo em frente. Deduzo que os elogios vêem de pessoas que sacam um pouco de estilo. São pessoas que reparam—como eu, e com certeza sabem o que é legal e de bom gosto. Raramente alguém que eu considero cafona me elogia. Mas quando isso acontece eu fico deveras preocupada. Hoje a jornalista que trabalha comigo elogiou a minha camiseta. Vou ter que me livrar dela—a camiseta—urgentemente!
coisas que eu gosto muito de ver
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O grupo de estudantes que se instala no meio de um dos principais bike circles do campus, coloca uma boombox no centro e faz ali um clube de dança, com casais rebolando e piruetando alegremente no meio da rua. Eu adoro ver isso! Shall we dance?
O professor que leva seus alunos para o gramado do Quad e dá sua aula ao ar livre. Tenho vontade de parar pra ouvir o que ele fala. Pedalo sorrindo por essa cena. A cara de felicidade dos alunos com seus livros no colo é uma coisa impressionante. To Sir with Love.
pena que acabou
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O final de semana só terminou hoje. E foi bem auspicioso, com atividades legais, pessoas legais, papos legais. Teve social aqui em casa, social na casa da Leila e social na casa da Elise. Cozinhei coisas boas. Falamos de azeite, azeitonas e de como dá pra ver a Africa nos dias claros em Sevilla. Fez sol, eu nadei, nadei, nadei, nadei e mudei de cor. Vesti um vestido. Ouvi duas pessoas dizerem—i like your dress, and you look good in green. Green que te quero green, a grama foi cortada, as roseiras foram podadas, jantamos no quintal sob as lanterninhas de luz, fez frio, tomamos muitos sabores de sorvete, e vinho, e agora acabou.