Uma moça muito limpinha
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A minha hora de almoço não é só para as comilanças. Eu geralmente tiro os sapatos e a roupa e visto um roupão, pois isso me ajuda a estender um pouco mais o prazo da elegância e a aguentar mais umas horas de confinamento vestuário. Nessa hora do almoço eu também escovo os dentes e passo fio dental. E ás vezes lavo o rosto, ás vezes lavo os pés, ás vezes eu tomo um banho, e sempre retoco o perfume, penteio as sobrancelhas e coisas assim. Mas num belo dia, ás dez da manhã eu encasquetei que meu vestido estava cheirando estranho no sovaco. E eu não simplesmente encasqueto, eu despiroco total. Ninguém aqui chega suficientemente perto de mim para sentir cheiro de nada, mas mesmo assim eu entro num estado de descontrole insano. Então na hora do almoço eu cheguei em casa e lavei o vestido. Sim, mes amis, LAVEI. Usei um sabão liquido que supostamente elimina os maus odores e lavei os sovacos do vestido, que molhou também nas costas. Pendurei o dito na janela do banheiro – bem cortiço style – e fui comer. Lógico que o vestido não secou! Eu fico realmente sem graça de voltar pro trabalho vestindo outra roupa, como se eu fosse uma reles dondoca fútil. Então revesti o vestido daquele jeito mesmo. E voltei pedalando, com o sovaco e as costas molhadas, tão fresca, tão limpinha.
não esqueça do ponto final
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E daí? Não li o livro nem vi o filme O Código Da Vinci. Não tenho um IPod. Nunca vi as séries de tevê Lost e 24. Não uso relógio.
E então? Você tem cinco minutos sobrando. Vai checar e responder e-mail, comer um cachorro-quente, tomar um banho, ler um artigo no jornal, ou deitar e fechar os olhos.
E agora? Descolei uma outra maneira de sujar/manchar/destruir minhas roupas. Não bastante os respingados de suco de uva e molho de macarrão, agora tem também a graxa da correia da bicicleta.
For All
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O dia foi de calor extremo, os termômetros marcando 45ºC. Nunca vi uma coisa assim em todos os meus anos vivendo aqui. Combinamos de ir a um baile, onde uma banda anunciada como vinda diretamente da Paraíba iria tocar um autêntico forró do Pé da Serra. Saímos quase dez da noite e ainda estava 38ºC sem nenhuma brisa, nada, só um bafão extremamente pesado. Chegamos no bailão frescos, graças ao ar condicionado do carro. Mas lá o bicho começou a pegar. Todo mundo suava, quem estava dentro do galpão com ar condicionado e ventiladores e, pior, quem estava fora, no barzinho tomando uma cervejinha. Consumimos muitas garrafinhas com água gelada. Quando o forró começou, com o grupo de baixinhos vestindo chapéu de cangaceiro – viola, zabumba, sanfona, triângulo – foi um dancetê total. Os casais se requebravam e suavam, nós no grupão. Eu sentia o suor escorrer pelas minhas costas, pelas pernas, pingar da minha sobrancelha e do queixo. Dançamos muito, muito, pois forró é muito divertido! No intervalo fomos conversar com os músicos que – surpresa, caRRRinhas – eram todos piracicabanos! Conversamos um tanto com eles, que nos contaram que fazem turnê pelos EUA até março de 2007 e que arrasaram Paris em chamas em Las Vegas. Quando eles voltaram a tocar, nós voltamos a dançar. O galpão fervia, o ar condicionado e os ventiladores não estavam mais dando conta do recado. Quando resolvemos ir embora, passamos pela banda apertando a mão dos músicos um por um.
– Boa sorte! Tudo de bom pra vocês, boa turnê!
– Obrigado e fica com Deus!
Sempre a mesma história…
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— Você é do Oriente Médio?
— Nãoo…
— É da Itália?
— Nãoo..
— Hmmm…
— Dúvido que você adivinhe.
— É do Sul? América do Sul?
— Sim.
— Hum… Equador?
— Nãooo…
— Venezuela?
— Nãooo..
— Hmmhh….
— Sou de um país que recebeu uma grande imigração de italianos.
— Argentina!
— NÃOOOO!!!
— Brasil!
— Sim!
Cruz credo, viu… nem sei porque me presto a esses diálogos bestas. O que interessa saber de onde eu vim? Eu sei que tenho essa cara multicultural de Samira Magnani, mas ainda fico incomodada quando sou abordada por alguém falando turco, persa ou tunisiano comigo. Bom, admito que é um pouquinho melhor que ouvir o famigerado “Hola!”
Esse papo já tá qualquer coisa…
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Eu estou pessimista como nunca imaginei um dia estar. Toda vez que vou ao supermercado, tenho ganas de fazer estoque de atum em lata e de galões de água. Sinto uma tristeza imensa, uma pena imensa, uma desilusão imensa. Eu sempre achei que a minha geração não iria viver cenas de filme de final do mundo. Já não acho mais…
recadinho
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Recebi isso hoje da minha mãe. Estou rindo até agora. Não lembro quem era a Lurdes, mas eu tinha uma amiga alemã chamada Ingrid e estava provavelmente tentando exibir as palavras em alemão, que certamente tinha aprendido de ouvido com ela. E a casa da Ingrid era assim amarela, com o telhado de telhas de barro e portas e janelas vermelhas . Em 1969 eu tinha 7 anos! Clique para ampliar e ver detalhes.
vamú de retro!
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Esta semana foi inaugurada com um acontecimento que me chateou muito e que ainda não se encerrou. A partir daí deu-se início a uma sequência de dias bestas, daqueles que gostaríamos de apagar da memória da nossa existência. Podemos classificá-los como dias de trânsito astral ruim, retrógado, pesado. São dias que ficaram infectados, dias mofados, purulentos, cascudos, fétidos. Nesses dias não há muito o que fazer, pois nada dá certo, por mais que você se concentre e se esforce. Eles atraem dores, acidentes, esperas inúteis, irritação, choradeira, decisões emocionais, precipitações, preocupação, tristeza, temor, desânimo, raios e trovoadas. Sabemos que dias assim com certeza passarão. Manter-se firme durante o trajeto é que não é fácil.